Em artigo publicado em maio pelo DN, diz-nos Philippe Legrain, prestigiado economista e conselheiro do presidente da comissão europeia entre 2011 e 2014 que a Europa devia abrir as suas portas e deixar entrar livremente os migrantes. Do ponto de vista meramente económico (que é aquele que o autor defende) e em teoria, concordo com o seu ponto de vista. A chegada massiva de mão-de-obra barata e pouco qualificada para uma economia à beira de uma estagnação secular seria uma lufada de ar fresco.
Mas será essa uma solução idónea? Vejamos esta situação doutras perspectivas e o que nos diz a história sobre esta problemática.
Desde a pré-história que o ser humano se movimenta. É uma necessidade intrínseca ao homem desde que este era caçador-recolector e por isso se deslocava em busca de alimento.
Necessidade. Essa é a palavra-chave para entender o porquê das deslocações do ser humano. A ela podemos associar as necessidades básicas da pirâmide de Maslow (fisiológicas e de segurança) mas não só. A história mostra-nos que entre os critérios que levam à deslocação humana, a expansão também se encontra entre os motivos. E esta por sua vez existe por outros motivos, menos evidentes e inseridos em estratégias que visam alcançar um objectivo planeado antecipadamente.
Como a história parece ser cíclica, a Europa há 1600 anos atrás passou por uma crise semelhante à actual.
Recuemos ao período do império romano. Sabemos que foi graças às migrações/invasões bárbaras (entre outras razões) que o império romano entrou em colapso. Mas os romanos aquando da sua expansão já tinham invadido outros territórios previamente ocupados. A diferença é que os bárbaros na sua grande maioria migraram param o império romano por necessidade. Os romanos expandiram-se por conquista. Reside aqui a diferença entre migração e invasão. Migração implica deslocação assente em motivos pacíficos. Invasão é um acto de ocupação pela força.
A partir do século III o império romano atravessou uma grave crise a nível político, económico, demográfico e cultural. A esplendorosa civilização que este povo construiu a partir da península itálica entrou em declínio acentuado. Primeiro foi o fim da política expansionista. Houve uma quebra do poderio militar que a médio/longo prazo entrou em anarquia. Os generais rebelavam-se contra os imperadores que se sucediam no governo por períodos de tempo muito curtos não dando tempo para por em prática as suas ideias. Depois tudo se desencadeou. O fim das ofensivas levou a que não houvesse novos territórios por explorar. Sem vencidos deixou de haver escravos. Sem escravos há uma crise de mão-de-obra, o que leva a menor produção, menos produtos no mercado, subida da inflação e por fim uma grave crise comercial que teve como consequências a estagnação da economia, quebra demográfica e êxodo urbano.
A expansão do cristianismo por outro lado também contribuiu para o enfraquecimento do poderio romano ao defender ideologias que eram antagónicas aos valores da sociedade romana, como a noção de igualdade entre homens independentemente do estrato social ou o fim do culto ao imperador.
Todo este cenário piorou com a pressão constante dos povos bárbaros no limes do império. Alguns entraram pacificamente colonizando algumas partes, incorporando o exército e adquirindo estatuto de federados. Outros, (Hunos) vinham para o saque e a conquista. A pressão cada vez maior por parte desses povos levou ao desastre de Adrianópolis (378) em que as legiões romanas, contra todas as previsões foram humilhadas pelas hostes visigodas.
A divisão do império entre império do ocidente e do oriente mais não fez que adiar a morte anunciada da parte latina que no século V estava já completamente descaracterizada e em 476 daria o seu suspiro final.
A Europa entraria agora num período negro de regressão civilizacional.
Andemos agora muitos séculos em diante no relógio do tempo e estabeleçamo-nos nos Estados Unidos da América na transição do século XIX para o XX. Por si só, esta nação foi construída por emigrantes e dissidentes. A sua declaração de independência e a sua constituição são os primeiro documentos que promovem a igualdade entre todos os homens, antes ainda da revolução francesa. No entanto, demorou muito até que a sociedade norte americana assimilasse os valores que ela própria criou e documentou. Foram precisas grandes clivagens internas e uma sangrenta guerra civil para que Abraham Lincoln apelasse aos sagrados valores da declaração da independência num discurso que ficou célebre.
Serve esta introdução para contextualizar que a Europa, essa mesma Europa que agora se vê face a face com um problema de imigração massiva, também procurou uma vida melhor e atravessou massivamente o Atlântico em busca do “american dream”, naquela que foi uma migração em números incomparáveis na história da humanidade.
Entre europeus oriundos da europa do leste (polacos e eslavos sobretudo), europa meridional (italianos, balcânicos e franceses) e irlanda, estima-se que entre 1840 e 1920 terão entrado nos Estados Unidos cerca de 15 milhões de pessoas! O que as motivava eram factores comuns a todos os seres humanos que emigram. Fuga às guerras, às fomes, procura por melhores condições de vida, etc. A questão que aqui se coloca é que não só foi possível integrar essa imensa massa humana, como essa mesma massa fez desenvolver e prosperar esse país a um nível nunca antes visto, a ponto de este se tornar na maior potência mundial do século XX. Como foi possível integrar tanta gente? Primeiro porque havia espaço para todos. No final do século XIX o Oeste americano estava ainda muito escassamente colonizado. Depois porque culturalmente europeus e americanos eram similares em usos, costumes e religiões. Finalmente porque havia toda uma nação para construir e havia por isso necessidade de mão-de-obra. Apesar dos graves problemas sociais que se geraram com a chegada de tanta gente, a verdade é que o saldo final acaba por ser positivo e o sonho americano acabou mesmo por triunfar de uma forma geral.
Voltemos agora aos nossos tempos. Pode a Europa suportar
uma migração em massa como o fizeram os Estados Unidos? Ou vai essa migração
resultar no colapso da débil união europeia como aconteceu muitos séculos antes
com o império romano?
Vejamos: a Europa é um continente envelhecido. Abrir as portas aos milhões de pessoas que procuram o sonho europeu, jovens na sua maioria, iria travar os índices demográficos negativos. E ao recebermos um grande nº de mão-de-obra não qualificada poderíamos criar uma alavanca para sair da crise económica. Mas há qualquer coisa que não bate certo… Por que razão os refugiados procuram massivamente a fuga para a Europa? Está mais que visto e mais tarde se verá com mais clareza (quando os níveis de xenofobia aumentarem) que o velho continente não os deseja por serem cultural e religiosamente diferentes. Se os muçulmanos fossem desejados, a Turquia já há muito tinha sido aceite como membro da UE. Por outro lado, a lentidão de Bruxelas em se pronunciar e criar directrizes sobre este problema é exasperante. Sobre a crise económica grega marcavam-se reuniões de um dia para o outro se fosse preciso. Sobre um desastre humanitário, demora-se semanas…
Quanto aos refugiados pergunto-me porque não escolheram outro destino. Do Iraque e da Síria para a península arábica é um caminho bem mais curto e provavelmente menos perigoso. E aí estão países prósperos e pacíficos, além de cultural e religiosamente semelhantes aos destes. Falo da Arábia Saudita, do Kuwait, do Bahrain, do Qatar e dos Emirados Árabes Unidos. Mas estes países mostram-se pouco receptivos para receber os refugiados. Porque virão com eles os terroristas do estado islâmico infiltrados? É uma real possibilidade e um dos factores que certamente os deve inibir de prestar auxílio.
Porque foi escolhida então a Europa? Um continente que para o muçulmano representa o detestado ocidente com a sua pecaminosa liberdade que descamba em libertinagem? Porque quando há insegurança e desespero os ideais morrem, ou porque o Estado islâmico (ao estilo cavalo de tróia) incitou à migração em massa para dentro do velho inimigo que pretende conquistar? Quero acreditar na primeira razão, mas não posso deixar de me preocupar com a segunda. A Europa também se devia preocupar.
Uma coisa é inevitável, agora que os refugiados/migrantes cá estão, penso que é nosso dever enquanto humanos de matriz cristã auxiliá-los pondo de lado as nossas diferenças, mas mostrando que na nossa casa as coisas funcionam segundo as nossas regras e estes terão de se integrar e adaptar à nossa sociedade. Mas isso inevitavelmente vai trazer custos. E não falo só em matéria económica...
Vejamos: a Europa é um continente envelhecido. Abrir as portas aos milhões de pessoas que procuram o sonho europeu, jovens na sua maioria, iria travar os índices demográficos negativos. E ao recebermos um grande nº de mão-de-obra não qualificada poderíamos criar uma alavanca para sair da crise económica. Mas há qualquer coisa que não bate certo… Por que razão os refugiados procuram massivamente a fuga para a Europa? Está mais que visto e mais tarde se verá com mais clareza (quando os níveis de xenofobia aumentarem) que o velho continente não os deseja por serem cultural e religiosamente diferentes. Se os muçulmanos fossem desejados, a Turquia já há muito tinha sido aceite como membro da UE. Por outro lado, a lentidão de Bruxelas em se pronunciar e criar directrizes sobre este problema é exasperante. Sobre a crise económica grega marcavam-se reuniões de um dia para o outro se fosse preciso. Sobre um desastre humanitário, demora-se semanas…
Quanto aos refugiados pergunto-me porque não escolheram outro destino. Do Iraque e da Síria para a península arábica é um caminho bem mais curto e provavelmente menos perigoso. E aí estão países prósperos e pacíficos, além de cultural e religiosamente semelhantes aos destes. Falo da Arábia Saudita, do Kuwait, do Bahrain, do Qatar e dos Emirados Árabes Unidos. Mas estes países mostram-se pouco receptivos para receber os refugiados. Porque virão com eles os terroristas do estado islâmico infiltrados? É uma real possibilidade e um dos factores que certamente os deve inibir de prestar auxílio.
Porque foi escolhida então a Europa? Um continente que para o muçulmano representa o detestado ocidente com a sua pecaminosa liberdade que descamba em libertinagem? Porque quando há insegurança e desespero os ideais morrem, ou porque o Estado islâmico (ao estilo cavalo de tróia) incitou à migração em massa para dentro do velho inimigo que pretende conquistar? Quero acreditar na primeira razão, mas não posso deixar de me preocupar com a segunda. A Europa também se devia preocupar.
Uma coisa é inevitável, agora que os refugiados/migrantes cá estão, penso que é nosso dever enquanto humanos de matriz cristã auxiliá-los pondo de lado as nossas diferenças, mas mostrando que na nossa casa as coisas funcionam segundo as nossas regras e estes terão de se integrar e adaptar à nossa sociedade. Mas isso inevitavelmente vai trazer custos. E não falo só em matéria económica...
Está criado o cenário, o que acontecerá agora na Europa a médio/longo
prazo? O que sucedeu no pós-Roma ou o que sucedeu nos EUA? Os tempos e
enquadramentos diferentes dos dois primeiros exemplos tornam difícil estabelecer
um paralelismo perfeito com o que sucede actualmente.
O tempo dirá o que vai acontecer. Para bem dos nossos filhos, espero que os ideais europeus não morram. Todavia sei que o velho mundo sofrerá uma profunda reformulação. Que seja para melhor é o que desejo, para que cenas horríveis como a do menino morto e todas as que acontecem diariamente no médio oriente e que nos chocam a todos, não venham a acontecer à porta das nossas casas, nem nas nossas praias…
O tempo dirá o que vai acontecer. Para bem dos nossos filhos, espero que os ideais europeus não morram. Todavia sei que o velho mundo sofrerá uma profunda reformulação. Que seja para melhor é o que desejo, para que cenas horríveis como a do menino morto e todas as que acontecem diariamente no médio oriente e que nos chocam a todos, não venham a acontecer à porta das nossas casas, nem nas nossas praias…